Gerd Simon é um engenheiro económico formado na universidade de Karlsruhe na Alemanha. Com 52 anos de idade, é casado e tem 3 filhos. Co-fundador do que hoje é chamado internet alemão, tem a sua base de operações próximo de Frankfurt.

Trabalha como consultor de gestão independente não apenas na Alemanha e na Europa mas também no Médio Oriente, África e Asia. Gerd Simon é o entrevistado da África Today para falar sobre os benefícios da Cloud (nuvem).

 

Frankfurt é referenciada como um exemplo de sucesso em matéria de conectividade em nuvem na Europa, podes falar-nos um pouco disso?

Quando recuamos para 1995 na altura em que a internet começou a ser comercializada, Frankfurt já era o centroda Alemanha para as telecomunicações internacionais. Naquela altura mais de 80% de todas as linhas internacionais de telecomunicações começavam ou terminavam em Frankfurt. Isto constituía uma espécie de ambiente ideal para aumentar a capacidade das telecomunicações na Alemanha. Mas demorou alguns anos até que o investimento em bases de dados começasse a acontecer em Frankfurt e eu fui um dos primeiros empresários a investir na criação de bases de dados para internet.

Foi um investimento que se resumia a conectar provedores de serviços, plataformas de disponibilização de conteúdo e operadores de telecomunicações. Na altura existiam apenas algumas empresas a operar, cerca de 20 ou 30.

Hoje há 650 empresas de internet conectadas ao ponto de troca de tráfego de internet alemão que actualmente suporta mais de 5.1 Terabytes por segundo de tráfego em seu ponto máximo.

Este ambiente é tudo que os intervenientes na nuvem precisam, ou seja, acesso rápido em escala para que os dados cheguem aos usuários. Actualmente estamos a falar de 400 mil metros quadrados de espaço para bases de dados, sendo que há 20 anos não havia nada e nos dias de hoje, apenas em Frankfurt temos 400 mil metros quadrados de espaço ocupado por bases de dados (de data centres).

Frankfurt é o lugar ideal na Europapara o desenvolvimento da computação em nuvem devido à densidade da rede e à densidade de conteúdo disponível,que são capazes de gerar um fluxo considerável de dados para os usuários. Estes usuários não estão apenas na Alemanha, estão localizados num raio de mais de dois mil quilómetros a volta de Frankfurt, permitindo um crescimento de conectividade em escala bastante rápida para todas as outras cidades. Isto quer dizer que quando queremos alcançar usuários na Europa, na Rússia ou até mesmos no norte de África, a forma mais fácil e rápida é através de Frankfurt. Tudo isto não foi criado da noite para o dia, foi um processo longo de investimentos, que tornou Frankfurtna placa giratória do digital da Alemanha, ou seja a cidade capital digital da Alemanha.

Em 1995 não havia um mercado digital na Alemanha. Hoje, só o mercado da computação em nuvem vale centenas de milhares de dólares e tudo isto foi criado em apenas 20 anos. E este facto nos dá uma perspectiva do caso de Angola, particularmente porque os investimentos que estão a ser feitos hoje colocam o país na linha da frente do desenvolvimento da internet em África, podendo potencialmente traduzir-se num contributo ao PIB acima dos 20% em 20 anos.

Qual foi o papel do governo neste processo?

No começo houve pouca intervenção do Estado, sendo que a política era de não interferência e de deixar que o mercado auto regular-se, por isso quando as empresas de internet foram criadas havia uma espécie de zona cinzenta relativamente à forma como a internet devia ser regulamentada. Demorou alguns anos para que o governo começasse a intervir, exigindo que todos os provedores de internet passassem a ser certificados, provando que os serviços oferecidos se adequassem aos padrões básicos de segurança. Por outro lado, o governo local teve, desde o início, um papel importante no que toca à criação de uma rede de fibra óptica eficiente como suporte para a infra-estrutura criada por via do investimento privado.

Nos anos 90, devido a necessidade de conectar todos os edifícios da cidade à central de bombeiros através de uma linha de comunicação rápida e fiável, o governo da cidade decidiu fazer um investimento massivo na criação de uma rede de fibra óptica que diminuísse o tempo de resposta por parte do corpo de bombeiros. Em 1995 o governo local decidiu abrir a rede aos operadores comerciais para permitir que actualmente os operadores pudessem optar em alugar espaço na rede criada pelo governo local ou instalar os seus próprios cabos. Isto foi um grande incentivo para as empresas do sector de internet que sentiram-se bastante atraídas a instalarem-se em Frankfurt em detrimento de outras cidades europeias.

Apesar do investimento em infra-estruturas de rede e bases de dados ter sido totalmente de iniciativa privada, diferente de todas as outras cidade alemãs, nos anos 90 o Governo da Cidade de Frankfurt adquiriu linhas de fibra óptica. Outro factor importante que destaca Frankfurt de outras cidades europeias é o facto de que, não sendo a cidade capital da Alemanha, possui infra-estruturas de uma cidade capital no verdadeiro sentido da palavra, ou seja, tem um aeroporto com ligação para um grande número de países, tem sistemas de transportes modernos e excelentes sistemas administrativos. Portanto, estamos a falar de infra-estruturas características de capitais como Luanda, Paris, entre outras. Por esta razão todos os investimentos da indústria americana de internet passam por Frankfurt, condensando as maiores marcas mundiais do mercado da computação em nuvem, empresas como a Google, a Amazon, IBM, DELL, todas estão presentes em Frankfurt com as suas próprias bases de dados. Tudo isto porque a infra-estrutura global é sólida e fiável.

Outro aspecto importantíssimo que torna Frankfurt especial é a infra-estrutura eléctrica, ou seja, a segurança e a disponibilidade da rede eléctrica, tratando-se de uma cidade cujo tempo médio de interrupção de electricidade é de menos de dois minutos por ano. Trata-se de uma rede eléctrica altamente fiável.

Como a computação em nuvem pode ajudar os negócios e as economias?

Quando pensamos na computaçãotemos que nos lembrar das características principais de um computador. Um computador é constituído, basicamente, por uma CPU, memoria RAM e disco de armazenamento de dados e todos os computadores são iguais. Portanto, antigamente, quando precisássemos de suporte digital para os nossos conteúdos tínhamos que comprar máquinas que necessitam de um investimento considerável e que têm sempre memória limitada, o que significa que temos que comprar mais espaço, caso não sejasuficiente.Isto significa que temos que fazer um investimento considerável com infra-estrutura física vez após vez.

A computação em nuvem é um método que nos permite usar os recursos de um computador (CPU, memoria RAM e disco de armazenamento de dados) apenas o que precisamos, acedendo à nuvem pagamos apenas quando usamos o serviço. Isto significa que o custo com recursos tecnológicos reduz-se consideravelmente, o que constitui uma vantagem incomparável visto que a partir de dispositivos móveis podemos aceder a todo conteúdo que precisamos em qualquer lugar e a qualquer momento. Na computação em nuvem o nosso conteúdo fica armazenado numa base de dados (como o ANGONIX) que é na verdade um grande armazém com muita informação que pode ser acedida mais facilmente e com maior rapidez a partir de um laptop, tablet ou telemóvel.

Por exemplo, antigamente quando estivéssemos a desenvolver um programa e o quiséssemos testar ou comercializar, na forma tradicional levaríamos vários meses. Mas na nuvem os mesmos resultados podem ser alcançado em apenas duas semanas, visto que milhões de pessoas podem aceder a este programa ao mesmo tempo. Portanto, o acesso aos mercados e ao consumidor é bastante reduzido, com os consequentes aumentos de eficiência e produtividade.

Nos nossos dias há por volta de um milhão de aplicações disponíveis, sejam conteúdos andróide ou da Apple Store. Mas é necessário a criação de um ambiente que permita que todos tenham acesso a estas aplicações independentemente da sua localização geográfica. Estamos a falar de bases de dados bem posicionadas e bem conectadas e considerando que o volume anual de downloads é de 100 bilhões, existe um potencial de mercado inestimável que as empresas que criam conteúdos como aplicações, entretenimento, notícias etc, podem aceder através da computação em nuvem. Mas a base de tudo isto, como já foi referido, são estruturas como o Angonix, bem como uma rede de fibra altamente fiável.

Qual o impacto económico da computação em nuvem?

A computação em nuvem aumenta a eficiência facilitando oacesso à ferramentas de suporte. A nuvem é uma possibilidade de acedermos ao conhecimento global disponível sem que as empresas e instituições precisem de investir em infra-estruturas ou em criação de soluções de suporte. Por exemplo, se quisermos usar a melhor ferramenta de gestão de projectos, controlo de despesas, ou uma ferramenta de gestão de vendas, basta irmos a Internet, fazer uma subscrição e efectuar o pagamento por cada usuário. Isto que dizer que só pagamos quando usamos a ferramenta, evitando os custos de manutenção associados visto que tudo é feito na nuvem. Isto tem um impacto tremendo na flexibilidade e agilidade das empresas.

Para exemplificar este benefício, imagine que estamos na europa e precisamos de analisar dados sobre o mercado angolano ou namibiano. Tipicamente,teríamos que nos deslocar para estes países, tirar fotografias e nos reunirmos com pessoas, entre outras actividades.Há uma aplicação que está a ser desenvolvida na África do Sul que congrega free-lancers especializados em várias áreas que vivem permanentemente num dado país. Através desta aplicação podemos aceder a estes free-lancers que estão no terreno e que podem fazer todo o tipo de pesquisa, eliminando a necessidade de incorrermos em custos e outros riscos associados com deslocações. Resumindo, posso entrar em contacto com um determinado free-lancer, enviar os termos de referência da pesquisa de mercado que pretendo realizar e receber toda a informação recolhida, tudo isto num ambiente de nuvem.

Outro exemplo interessante é a comparação entre a cadeia global de hotéis Intercontinental, que opera em cerca de 100 países e tem cerca de 1 milhão de camas, e a plataforma de hospedagem online AIRBNB que opera em mais de 190 países contando com cerca de 2 milhões de camas. Uma análise superficial nos permite perceber que uma cadeia de hotéis como a Intercontinental tem que investir nos hotéis, em recursos humanos e numa estrutura de operação onerosa. No caso da AIRBNB, não tem nenhum destes custos visto que o seu modelo de negócios consiste em ligar as pessoas que precisam de acomodação às pessoas que têm quartos ou apartamentos disponíveis para alugar, sendo que o único investimento considerável que precisa de fazer é com softwares e na capacidade da sua Internet.

O interessante é que o valor de mercado da Intercontinental, cotado em bolsa, é de pelo menos 9 mil milhões USD e o valor de mercado da AIRBNB é de 25 mil milhões de USD. Podemos concluir que a computação em nuvem reduz o tempo e o custo de marketing, reduz os custo de instalação, início de operação ou de entrada no mercado, reduzindo as barreiras que dificultam a efectivação de um determinado negócio.

Outro exemplo é o de uma empresa suíça chamada Black Socks, que vende meias pretas através de uma plataforma de venda online. Trata-se de operação que é garantido por apenas 5 empregados que é capaz de gerar por volta de 20 milhões por ano. É possível encontrar estas meias na maioria dos hotéis do mundo e as entregas são feitas totalmente através de serviços postais. O modelo de negócios deles permite que os clientes estabeleçam a compra mensal ou anual de um determinado volume de meias. Estas são entregues em qualquer parte de mundo. Por outro lado, os clientes também podem enviar de volta as meias usadas que são recicladas pela empresa. O serviço é pago por cartão de crédito. Portanto estamos a falar de uma forma muito inteligente de criar novos negócios com modelos altamente eficientes, com um impacto considerável no crescimento económico dos países.

Em termos económicos, a computação em nuvem é comparável ao impacto da indústria de logística e distribuição e, dependendo do ambiente económico, pode atingir os 10% por ano, tratando-se de uma industria que, de acordo com a FORBES, valerá 67 bilhões até 2018. O mercado de trabalho também beneficia visto que estimula o surgimento de novas empresas e novos tipos de negócios, com impacto significativo na redução do desemprego.

Uma única frase, a indústria da computação em nuvem é a fundação de um novo tipo de prosperidade e a esta nova prosperidade eu chamo de Petróleo Digital.

Que tipo de empresas usufruem do beneficio da computação em nuvem?

Todo tipo de empresas, independente do seu objecto social ou da sua dimensão, pode beneficiar da nuvem. No caso das pequenas empresas é vantajosos porque não precisariam de gastar dinheiro com equipamento de tecnologia de informação, poderiam investir apenas em dipositivos móveis como laptops, smartphones e tablets e aceder aos seus dados, softwares e backups na nuvem, em qualquer parte do país. No caso das empresas maiores que já possuem as suas próprias bases de dados, é vantajoso caso queiram ter um backup ou necessitem de expandir a sua conectividade, ao invés de expandirem fisicamente podem faze-lo na nuvem.

Mas para que isto seja possível, falando especificamente de Angola é importante garantir uma conectividade altamente fiável, evitando uma má experiência de usuário que acaba por inibir a utilização das ferramentas tecnológicas. Ninguém quer aceder a um determinado conteúdo na internet e ver na sua tela: carregando… carregando… carregando… durante vários minutos. Isto faz com que as pessoas tentem outra coisa.

Por outro lado, a infra-estrutura que está a ser criada pela Angola Cables, nomeadamente o cabo submarino, a rede de fibra óptica e os Data Center, só poderá efectivamente contribuir para o crescimento económico angolano se for usada. É o que acontece com qualquer outra infra-estrutura: qual é a utilidade de um aeroporto de topo se não há aviões a usarem? O quanto vale uma auto-estrada se não há carros a usarem? Por isso é fundamental que se consiga aumentar exponencialmente a quantidade de pessoas ligadas à Internet.

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